Nomeado relator do Código Florestal na comissão de Meio Ambiente do Senado, Jorge Viana (PT-AC) se autoimpôs uma missão dicotômica. “Não vou vestir a roupa de ambientalista, mas vou trabalhar para que meio ambiente não saia perdendo”.
Otimista, o senador acha possível chegar a uma boa redação sem reproduzir a atmosfera de confronto que envenenou a Câmara. “Não vou cair na armadilha de opor os dois lados, ambientalistas contra ruralistas. É desnecessário”.
O discurso acomodatício de Viana é desafiado por um conflito que precede a própria análise do texto. Autor de dispositivos que desagradaram Dilma Rousseff, o PMDB vai indicar um segundo relator no Senado.
O senador Luiz Henrique (PMDB-SC) cuidará de destrinchar o projeto nas comissões de Constituição e Justiça e de Agricultura. Para o PMDB, deve seguir para o plenário do Senado o relatório de Luiz Henrique. Para o PT, o texto a ser votado pela Casa deve ser o de Viana.
Vão abaixo os principais trechos da entrevista de Jorge Viana ao blog:
– Como pretende relatar o projeto do Código Florestal? Sou engenheiro florestal, venho da terra de Chico Mendes, tenho lado. Mas não vou cair na armadilha de opor os dois lados, ambientalistas contra ruralistas. É desnecessário.
– Vai conseguir evitar a ótica ambientalista? Creio que o país precisa enxergar a questão um pouco por essa ótica. Hoje, temos muitos proprietários [rurais] em situação de irregularidade. É preciso resolver esse problema, mas não pode ficar só nisso. Não podemos tratar a floresta como se fosse o maior problema do Brasil.
– Como regularizar a situação dos irregulares? Há dois aspectos. O primeiro é o que trata da reserva legal. A polêmica maior está relacionada às áreas de proteção permanente.
– Qual é a diferença? A reserva legal fixa os limites de exploração de cada propriedade. Na Amazônia, era permitido explorar 50%. A outra metade tinha de ser preservada. Em 1996, o Fernando Henrique aumentou a área de preservação para 80%. Desde então, só 20% da área pode ser explorada. Isso elevou a credibilidade do Brasil no exterior. Mas ninguém consegue dizer quem já havia desmatado 50% de sua propriedade antes da alteração da regra e quem ficou em situação irregular depois de 1996. Tem que fazer um levantamento por Estado.
– E quanto à área de proteção permanente? Essa é mais sensível. Envolve as beiras de rio, encostas e manguezais. Como o nome diz, essas áreas precisam ser preservadas permanentemente. Muita gente ficou irregular porque desenvolveu culturas nessas áreas. Será preciso recompor.
– O que fazer com a anistia de multas prevista no projeto da Câmara? Primeiro, não se pode falar em anistia. Quem está disposto a fazer a recomposição das áreas desmatadas, será possível. Há um programa que o governo criou e que o Aldo [Rebelo, relator do projeto na Câmara] acatou. Abre-se uma porta para que as pessoas saiam da situação irregular e venham para a situação regular.
– Nesse caso, cancelam-se as multas, não? Se a pessoa adere ao programa e recupera o dano ambiental, está escrito no texto, pode ficar livre das multas. Isso tem acordo no governo.
– Mas não é essa a anistia que o Planalto rejeita? Quem fizer a recuperação da área vai ter custo. Alguém tem que pagar essa conta. Se tem um custo, não é bem anistia. O que precisamos é eliminar trechos dúbios. Não pode legalizar, por exemplo, uma pessoa que desenvolve atividade agropastorial em área de preservação permanente, com danos ao meio ambiente. Essa conciliação eu vou buscar no entendimento. O importante é verificar que mensagem vamos passar com essa lei. Se sair anistiando todo mundo, desprestigia quem está dentro da lei.
– Como produzir esse entendimento? Não vou vestir a roupa de ambientallista, mas vou trabalhar para que o meio ambiente não perca. No dia 11 de junho, vai caducar um decreto que institui o programa de recuperação de áreas ambientais. Caso isso ocorra, os proprietários irregulares estarão submetidos a um quadro de insegurança jurídica [terão de pagar as multas impostas até 2008 e ficarão impedidos de contrair empréstimos em bancos oficiais]. Isso mexe no bolso. É um forte argumento de negociação de que dispõe o governo.
– Pretende alterar o artigo que atribui poderes aos Estados para legislar em matéria ambiental? A Constituoição garante a Estados e Municípios poderes para legislar complementarmente sobre essa matéria. Mas não é correto jogar para entes que têm menos poderes a atribuição de legislar sobre temas que tratam de limites à atividade econômica. As questões centrais são exclusivas da União.
– Como conciliar o seu relatório com o do outro relator do Senado? Isso começou a ser questionado. Se prevalecer o bom senso, a questão de mérito ficará à cargo da comissão de Meio Ambiente. O outro relator deve ser o Luiz Henrique. Vou me sentar com ele, fazer um trabalho conjunto. Não vou atuar com radicalismo.
– Que resultados espera obter? Se código sair com a pecha de que Brasil recuou em avanços já obtidos em matéria de meio ambiente, produtos brasileiros como carne e soja vão começar a ser recusados lá fora. Há uma mudança no comportamento dos consumidores do mundo. A presidente Dilma nos disse isso. Se nos não acertarmos a mão na negociação vai ser ruim para o agronegócio. Ela disse: “Eu vou ter que andar mundo afora dizendo que agente não destrói o ambiente”.
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